Message in a pixel

Boas muletas: trabalho, filosofia, arte e literatura (agora caminho com Clarice, a entrevistadeira)
O ladrilho do meu caminho: as lembranças do vivido. Isso ninguém tira de mim.
Para iluminar, elliot, vindo da minha alice queridíssima:
“…And what you do not know is the only thing you know
And what you own is what you do not own
And where you are is where you are not…”
t. s. eliot. four quartets

ps:impressionantes as afetações digitais…

Wish I could capture it

Parece que ângela, lá de onde está, conspirou. A lua cheia de hoje, depois do pôr-do-sol, depois do amanhecer – junto com este frio bão, sequinho e iluminado – me embalou. Confesso: quem me inspira é o velho filósofo, André Comte-Sponville, o salvador de almas. Acompanhado, como sempre, pelo velho Keleman, o fazedor de corpos. Estou há dois dias com o pequeno volume andando comigo… me ilumina a vida. Olha só alguns trechos que marquei (entre outros que já estavam marcados das leituras anteriores):

“Não há amor feliz, nem felicidade sem amor. Não há amor feliz enquanto falta ao amor seu objeto. Não há felicidade sem amor, enquanto a felicidade se regozija. (…) mas o amor vai além do casal, além até da família (…) Não há sabedoria que não seja de alegria; não há alegria que não seja de amar. (…) Regozijar-se com o que é, em vez de se entristecer (ou só se regozijar de forma inconstante) com o que não é. Amar, em vez de esperar ou temer. “
Concluindo, lembrarei simplesmente que o contrário de esperar não é temer, mas saber, poder e regozijar-se. Numa palavra, ou antes em três, o contrário de esperar é conhecer, agir e amar. É a única felicidade que não nos escapa. Não o desejo do que não temos ou do que não é (a falta, a esperança, a nostalgia), mas o conhecimento do que é, a vontade do que podemos, enfim o amor do que acontece e que, portanto, já nem precisamos possuir. Não mais a falta, mas a potência, não mais a esperança, mas a fidelidade e a gratidão.
Só esperamos o que não depende de nós; só queremos o que depende de nós. Só esperamos o que não é, só amamos o que é. (…) trata-se de aprender a desejar o que depende de nós (isto é, aprender a querer e a agir), trata-se de aprender a desejar o que é (isto é, amar), em vez de desejar sempre o que não é (esperar e lamentar).
(…)Não tentem amputar a sua parte de loucura, de esperança, portanto de angústia e de temor. Aprendam, ao contrário, a desenvolver sua parte de sabedoria, de potência – em outras palavras, de conhecimento, ação e amor. Não se impeçam de esperar: aprendam a pensar, aprendam a querer um pouco mais e a amar um pouco melhor. (…)
A felicidade não é um absoluto, é um processo, um movimento, um equilíbrio, só que instável. (…) Paremos de sonhar nossa vida!
Não se trata de impedir de esperar nem de esperar o desespero. Trata-se, na ordem teórica, de crer um pouco menos e conhecer um pouco mais; na ordem prática, política ou ética, trata-se de esperar um pouco menos e de agir um pouco mais; na ordem afetiva ou espiritual, trata-se de esperar um pouco menos e amar um pouco mais. ”

Fim da transmissão…

Lemas, efeitos e conseqüências

quando a esperança vier, esquece e trabalha
quando a dor quiser entrar, coloque de lado e trabalhe mais
quando você achar que não pode mais, siga em frente: trabalhe!
e se a falta, a dor e a morte entrarem no seu coração?
Não esmoreça, trabalhe mais um pouco!

Esta é uma velha estratégia numa nova vida. Trabalhar para não sentir. Trabalhar para não pensar. Trabalhar para não olhar para mim.
Segunda morreu a Ângela, mulher que eu nunca conheci. A história está mais ou menos contada no blog da Renata Simões, que era amiga. Não sei bem quem sou: quem foi ou quem ficou. Estou nos dois, meio morta, meio viva. Deixei um comentário lá que é quase um bilhete suicida… que horror! Pelo menos agora, entre um trabalho e outro, há água, muita água para escorrer. Ainda bem.
O susto se desmancha e a vida volta. Depois da queda, levantar-se e seguir. Tremer, solidificar a nova forma e reaprender o caminho. Tantas vezes quantas necessárias forem. E prometo nunca deixar a vontade de desistir tomar o meu coração.

Ah, o amor

Por Marly de Oliveira, amiga de Clarice Lispector, em O Sangue nas Veias

Uma gema que fosse toda fria,
mas na aparência, e toda quente por dentro
e que tivesse a lisa superfície
do que se usa com grande atrevimento,
mas no íntimo; uma gema toda calma,
quase uma água esse fogo nos doendo,
um silêncio que fosse uma cascata,
mas do que o próprio fogo fosse o centro
e de que o próprio fogo fosse água.
Assim o amor, assim o que se espalha
e não se entorna, e vive do que vive,
e é móvel e capaz de ter limite;
assim o que se adestra e se dilata
como o sangue na veia, e é todo livre.