direto dos embalos da madrugada

trecho-treco
Chega a hora de ir dormir. Dia cheio, marcado por visitas. Finalmente conheci o Gerson Ramos, que era um ícone, e no fim da tarde Trecker, ele mesmo também visitou o albergue, com direito a uso ilimitado da conexão mixa (de sempre) do Virtua.

Escrevi um tanto, conversei muito e produzi… Dá satisfação chegar ao fim do dia assim, carregada de tarefas completas. Tá nem tanto… esqueci da janta, embalada nas conversas, nos projetos, na escrevinhação, nas janelinhas que pulam no IM…

Preciso cuidar disso. apesar de esquecer de comer com a maior facilidade (eu tenho preguiça, sério), eu estou abaixo do peso mínimo para a minha altura. resultado: IMC=18… não pode, não pode… Estou aqui esmiuçando a história da comida na minha vida, do alto destes bons 43 anos. E sei que tem a ver com solidão – esta minha solidão povoada na web, cheia de conexões.

Agora que a tempestade passou, é hora de fazer a lição de casa do meu homeopata: fazer companhia à minha solidão. Isso significa, meus anjos, que haverá um pouco mais de lufreitas por aqui, podem crer.

(e repita comigo: eu não vou chorar, eu não vou chorar, eu não vou chorar…)

Carinho

O que resta é a alegria da lembrança. Agradeço a TODOS os que me cuidaram e amaram. Principalmente os silenciosos ou PVTs…

foto do Manoel Netto, em algum momento de 2007.

Em memória da Charlote


Ela foi linda e companheira por 9 anos.

E agora, depois de um último suspiro nos meus braços, está navegando na luz.

Para embalar um dia cinza e triste, musiquinha by tia Nosphie

[update]

A senhora e os gatos do castelo agradecem a força, o apoio e a luz dos amigos citados abaixo (e pedem desculpas por eventuais esquecimentos…)

Zel (+Fer+ Groo e todos os furões); Denize; Nospheratt; Lu Monte, Cynthia, Jujuba – Luluzinhas queridas que não me abandonaram.

Para a Regina Favre, que me alimentou, me acolheu e me deu um mínimo de conforto no meio deste luto gigante.

Don Cardoso – eu sei o quanto aquela caretinha quer dizer…

Dona Lili – luz e força para a Graça aí.

Don Jorge – abraço recebido

– obrigada!!!

Beijo no coração para todos os que não comentaram, não twittaram – mas pensaram de alguma forma na gente.

Dos atos de amor que doem – e curam a dor

Charlote
Charlote

Ela é linda, ela é meiga, ela é querida. Tem nove anos, mais ou menos. Nesta foto, na noite do meu último aniversário, pesava cerca de cinco quilos. Começou a emagrecer e a fazer uma coisa esquisitíssima: comer o granulado sanitário…

No fim de maio, apareceu uma ferida. Parecia coisa de pele, levei ao veterinário. Tratamos. Ela apareceu com uma infecção pulmonar, sopro no coração, uma anemia braba e glóbulos brancos no pé. Tratamos a infecção – foram duas rodadas de antibióticos fortes. Ela deu uma melhoradinha e arrisquei: fui pro Descolagem no Nave e quando voltei senti o cheiro da encrenca. Veterinário ficou sem saber o que era.

De repente as articulações das patas incharam. começou na traseira esquerda, passou para a direita, chegou nas da frente. A gata encarangou, se entocou, eu precisava levar para fazer as necessidades, dar comida embaixo do nariz, água idem. Ela se entocou dentro de um armário, depois na cômoda, entre as toalhas, depois no outro armário, depois nas camisetas do EducaCamp, depois entre as minhas camisetas. E as visitas ao veterinário, semanais, quase, continuavam. Ele não desconfiava da razão.

Até que no começo de agosto, antes da maratona de eventos começar, eu respirei fundo e fui ao vet supermasterplus, especialistão em gatos, o cara que “cura” câncer e “faz milagres”. Recomendação do primeiro dos primeiros, um veterinário fofo a quem confiei meu tesouro mais querido: a Charlote.

Enquanto isso, a namorada de um amigo, também veterinária, que tem só 40 gatos, veio, olhou, viu os exames e disse: dê Leucogen para ela. Esclareço, este treco é um remédio usado para ajudar em quimeo e radioterapia, que ajuda a melhorar o sistema imunológico. Consulta com o mega master marcada, comprei o remédio e fui lá, na base do encaixe, com uma única pergunta: o que a Charlote tem?

Entrei no consultório. Lá estava o super professor da boa faculdade, cercado por 3 alunas e pela assistente. Contei a epopéia, a lista de medicamentos, mostrei os exames. Ele examinou a minha preta. Respirou fundo, olhou para mim e avisou “A perspectiva não é boa. Eu acho que ela tem um vírus que literalmente come toda a medula óssea e causa Leucemia”. Felv, na língua dos iniciados. Virus Felino da Leucemia (ou algo que o valha). Faça-se o exame e pelo amor de deus, me digam o que a minha gata tem!

Sangue retirado, fiquei só lá na sala, com uma veterinária loira e grandona, alemãzona, me consolando no momento de agonia com mil histórias de gatos. Dez minutos depois, o veterinário volta com um pedacinho de plástico nas mãos, um papel e uma frase: É pior do que imaginei.

Ok, dona Joaninha, quem mandou perguntar? “Ela tem FIV – o vírus da aids felina. Ele não é transmitido nem para humanos nem para cachorros, só entre gatos, pela saliva”. Ah, tá… E os outros três gatos que eu tenho em casa? “Podem ter ou não, precisamos testar. Muitos gatos são auto-imunes, simplesmente não desenvolvem a doença”. Faço o quê? Separo? “Não faça nada, se eles pegaram, já pegaram”. Ela viveu bem até os nove anos, sem nenhum sintoma. Ok, ok, um problema de cada vez. Lágrimas grossas desceram, pela primeira vez em muitos meses de peregrinação. Antes era só o coração apertado, a luta que terminava em derrota…

Ficou decidido que a gente tentaria banir a anemia, para poder dar o tal do AZT, o único retroviral que às vezes funciona nos felinos. Saí do consultório troncha, a gata fungava para os outros gatinhos da clínica de dentro do transporte… comprei o antibiótico, paguei a conta de tudo, entrei na farmácia de gente e comprei o levedo de cerveja e desci a ladeira (o consultório fica a duas quadras de casa) chorando. Chorei muito, muito, muito.

Isso tudo aconteceu há dois meses. Já se vão oito semanas de luta e remédios. A Charlote doce, meiga, carinhosa sumiu desde o episódio da “artrite” (que não era artrite, era uma infecção oportunista). Ela só comia aquele whiskas sachê, bla bla bla. consegui fazer o peso dela chegar a três quilos à base dos sachezinhos. E as feridas no corpo aumentando… Até que numa consulta eu resmunguei sobre as coceiras. Era o tal do sachê. Nhe! A gata quase ficou louca de dor e coceira, tadinha. Dá-lhe a ração hipoalergênica (que leva 80 dias pra fazer efeito…) e cortisona. Retorno em 15 dias.

Eu não quero que a minha gata sofra mais que o necessário e intrínseco à vida. Ela é amada-querida-idolatrada. Este serzinho que passou a vida me fazendo carinho, esquentando colo, amassando pão na minha barriga, brincando com suas bolinhas e dormindo com a pata no meu nariz, está tão doido de dor que se entala na rede de proteção, tenta fugir, desespero total… Segunda passou o dia todo chorando de dor. Nem o analgésico deu jeito.

Eu fiz o tal do retorno no mesmo dia. Eu só posso imaginar o que está acontecendo com ela. E vou dizer, não é bom. E tomei coragem para perguntar para onde a história vai… Saber perguntar é uma arte, estão sabendo? E ela está sofrendo bastante, o vet confimou. E já avisou que vai piorar. Quando pedi ajuda para definir o momento de dizer chega, ele meio tirou o corpo fora “você tem que decidir a eutanásia, eu só faço” (ou algo do gênero). Chorei de novo, mais que da primeira vez. Já pensou colocar para dormir um serzinho que só te deu carinho, alegria? Eu meio que já decidi. E aproveitei para explicar este assunto com o objeto do meu afeto.

O resultado da ópera trágica termina logo. Sexta-feira vamos ao dermatologista e vamos ver se o drama tem jeito. Mas ela tá ruim. Ontem eu travei de dor. No começo da noite desisti de tentar trabalhar, deitei no sofá embrulhada num edredom em busca de um tico de conforto. E o conforto veio, na forma de uma gata preta, de nove anos de idade, que se enfiou embaixo da coberta comigo e colocou a pata na minha cara. Ela sabe, ela entende, ela aceita. E eu tenho que tirar forças sabe a Deusa de onde para estar lá com ela e fazer o que tem que ser feito.

Carne fria

Estendida, a carne, que um dia foi “minha”, fria, fria fria.

A mesma que me ensinou a fazer nhoque, massa de torta.

A mesma que me deu milhares de fotonovelas absolutamente impróprias para a minha idade.

A mesma que me ajudou a caminhar, a estudar.

Aquela que sonhou que eu ia ser grande… casar, ter filhos (morreu sem isso, pecado)

Aquela carne que me deu abrigo no meio da tormenta, que me confortou quando os monstros entravam embaixo da minha cama, pela janela.

Os olhos azuis, azuis, fechados, já não vêm o meu sorriso – nem as minhas lágrimas

As mãos que fizeram aventais da pré-escola, tapetes de crochê e pegadores de panela se cruzaram, com o terço bonito sobre elas.

Foram as mesmas mãos que plantaram a flor de maio que está na varanda.

As mesmas que alisaram os meus cabelos. Elas mesmas.

As mesmas mãos que trocaram fraldas de duas gerações, que cuidavam de cachorros, gatos e plantas. Aqueles olhos que adoravam novelas – qualquer uma.

Adeus olhos. Adeus mãos. Alô tristeza.